sexta-feira, 28 de março de 2025

Canguru Matemático...

 ...mais uma edição bem sucedida, no presente ano letivo. Parabéns a todos os envolvidos na iniciativa!



Soneto de Camões - SE TANTA PENA TENHO MERECIDA

Se tanta pena tenho merecida
Em pago de sofrer tantas durezas,
Provai, Senhora, em mim vossas cruezas,
Que aqui tendes uma alma oferecida.

Nela experimentai, se sois servida,
Desprezos, desfavores e asperezas,
Que mores sofrimentos e firmezas
Sustentarei na guerra desta vida.

Mas contra vosso olhos quais serão?
Forçado é que tudo se lhe renda,
Mas porei por escudo o coração.

Porque, em tão dura e áspera contenda,
É bem que, pois não acho defensão,
Com me meter nas lanças me defenda.

 

Luís de Camões

Soneto de Camões - QUANDO DA BELA VISTA O DOCE RISO

Quando da bela vista e doce riso
Tomando estão meus olhos mantimento,
Tão enlevado sinto o pensamento,
Que me faz ver na terra o Paraíso.

Tanto do bem humano estou diviso,
Que qualquer outro bem julgo por vento;
Assi[m] que, em caso tal, segundo sento,
Assaz de pouco faz quem perde o siso.

Em vos louvar, Senhora, não me fundo,
Porque quem vossas cousas claro sente,
Sentirá que não pode conhecê-las.

Que de tanta estranheza sois ao mundo,
Que não é de estranhar, Dama excelente,
Que quem vos fez fizesse céu e estrelas.

Luís de Camões

Soneto de Camões - DE QUANTAS GRAÇAS TINHA, A NATUREZA

De quantas graças tinha, a Natureza

Fez um belo e riquíssimo tesouro,
E com rubis e rosas, neve e ouro,
Formou sublime e angélica beleza.

Pôs na boca os rubis, e na pureza
Do belo rosto as rosas, por quem mouro;
No cabelo o valor do metal louro;
No peito a neve em que a alma tenho acesa.

Mas nos olhos mostrou quanto podia,
E fez deles um sol, onde se apura
A luz mais clara que a do claro dia.

Enfim, Senhora, em vossa compostura
Ela a apurar chegou quanto sabia
De ouro, rosas, rubis, neve e luz pura.

 

Luís de Camões

Soneto de Camões - VOSSOS OLHOS, SENHORA, QUE COMPETEM

Vossos olhos, Senhora, que competem
Com o Sol em beleza e claridade,
Enchem os meus de tal suavidade,
Que em lágrimas de vê-los se derretem.

Meus sentidos prostrados se submetem
Assim cegos a tanta majestade;
E da triste prisão, da escuridade,
Cheios de medo, por fugir remetem.

Porém se então me vedes por acerto,
Esse áspero desprezo com que olhais
Me torna a animar a alma enfraquecida.

Oh gentil cura! Oh estranho desconcerto!
Que dareis c' um favor que vós não dais,
Quando com um desprezo me dais vida?

Luís de Camões

Poema de Camões - O CISNE, QUANDO SENTE SER CHEGADA

 

O cisne, quando sente ser chegada
A hora que põe termo a sua vida,
Música com voz alta e mui subida
Levanta pela praia inabitada.

Deseja ter a vida prolongada
Chorando do viver a despedida;
Com grande saudade da partida,
Celebra o triste fim desta jornada.

Assim, Senhora minha, quando via
O triste fim que davam meus amores,
Estando posto já no extremo fio,

Com mais suave canto e harmonia
Descantei pelos vossos desfavores
La vuestra falsa fé y el amor mio.

                   Luís de Camões

Soneto de Camões - QUEM VÊ, SENHORA, CLARO E MANIFESTO

Quem vê, Senhora, claro e manifesto
O lindo ser de vossos olhos belos,
Se não perder a vista só em vê-los,
Já não paga o que deve a vosso gesto.

Este me parecia preço honesto;
Mas eu, por de vantagem merecê-los,
Dei mais a vida e alma por querê-los,
Donde já não me fica mais de resto.

Assim que a vida e alma e esperança,
E tudo quanto tenho, tudo é vosso,
E o proveito disso eu só o levo.

Porque é tamanha bem-aventurança
O dar-vos quanto tenho e quanto posso,
Que, quanto mais vos pago, mais vos devo.

 

Luís de Camões

Soneto de Camões - QUE PODEREI DO MUNDO JÁ QUERER

Que poderei do mundo já querer,
que, naquilo em que pus tamanho amor,
não vi senão desgosto e desamor,
e morte, enfim; que mais não pude ver!

Pois vida me não farto de viver,
pois já sei que não mata grande dor,
se cousa há que mágoa dê maior,
eu a verei; que tudo posso ver,

A morte, a meu pesar, me assegurou
de quanto mal me vinha; já perdi
o que perder o medo me ensinou.

Na vida desamor somente vi,
na morte a grande dor que me ficou;
parece que para isto só nasci. 

 

Luís de Camões

Soneto de Camões - POIS MEUS OLHOS NÃO CANSAM DE CHORAR

Pois meus olhos não cansam de chorar
Tristezas não cansadas de cansar-me;
Pois não se abranda o fogo em que abrasar-me
Pôde quem eu jamais pude abrandar;

Não canse o cego Amor de me guiar
Donde nunca de lá possa tornar-me;
Nem deixe o mundo todo de escutar-me,
Enquanto a fraca voz me não deixar.

E se em montes, se em prados, e se em vales
Piedade mora alguma, algum amor
Em feras, plantas, aves, pedras, águas;

Ouçam a longa história de meus males,
E curem sua dor com minha dor;
Que grandes mágoas podem curar mágoas.

Luís de Camões

Soneto de Camões - AMOR É FOGO QUE ARDE SEM SE VER


Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

                           Luís de Camões

 

Poema de Camões - VEJO-A NA ALMA PINTADA

 

       Glosa a mote alheio

      "Vejo-a na alma pintada,
       Quando me pede o desejo
       O natural que não vejo."

Se só no ver puramente
Me transformei no que vi,
De vista tão excelente
Mal poderei ser ausente,
Enquanto o não for de mi.
Porque a alma namorada
A traz tão bem debuxada
E a memória tanto voa,
Que, se a não vejo em pessoa,
"Vejo-a na alma pintada."

O desejo, que se estende
Ao que menos se concede,
Sobre vós pede e pretende,
Como o doente que pede
O que mais se lhe defende.
Eu, que em ausência vos vejo,
Tenho piedade e pejo
De me ver tão pobre estar,
Que então não tenho que dar,
"Quando me pede o desejo."

Como àquele que cegou
É cousa vista e notória,
Que a Natureza ordenou
Que se lhe dobre em memória
O que em vista lhe faltou,
Assim a mim, que não rejo
Os olhos ao que desejo,
Na memória e na firmeza
Me concede a Natureza
"O natural que não vejo."

               Luís de Camões

Soneto de Camões - BUSQUE AMOR NOVAS ARTES, NOVO

Busque Amor novas artes, novo engenho,
para matar-me, e novas esquivanças;
que não pode tirar me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.

Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,

vem não sei como, e dói não sei porquê.


Luís de Camões

Soneto de Camões - VENCIDO ESTÁ DE AMOR MEU PENSAMENTO


Vencido está de amor meu pensamento
o mais que pode ser vencida a vida,
sujeita a vos servir e instituída,
oferecendo tudo a vosso intento.

Contente deste bem, louva o momento
ou hora em que se viu tão bem perdida;
mil vezes desejando a tal ferida
outra vez renovar seu perdimento.

Com essa pretensão está segura
a causa que me guia nesta empresa,
tão estranha, tão doce, honrosa e alta.

Jurando não seguir outra ventura,
votando só por vós rara firmeza,
ou ser no vosso amor achado em falta. 

 

Luís de Camões

Soneto de Camões - O DIA EM QUE NASCI MORRA E PEREÇA


O dia em que nasci moura e pereça,
Não o queira jamais o tempo dar;
Não torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o Sol padeça.

A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça,
Mostre o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.

As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lágrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem que o mundo já se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao Mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!

                     Luís de Camões

Poema de Camões - VERDES SÃO OS CAMPOS


Verdes são os campos,
De cor de limão:
Assim são os olhos
Do meu coração.

Campo, que te estendes
Com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,
De ervas vos mantendes
Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.

Gados que pasceis
Com contentamento,
Vosso mantimento
Não no entendereis;
Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.

              Luís de Camões

 

Poema de Camões - SE NO QUE TENHO DITO VOS OFENDO

Se no que tenho dito vos ofendo,
Não é a intenção minha de ofender-vos,
Qu'inda que não pretenda merecer-vos,
Não vos desmerecer sempre pretendo.

Luís de Camões

Poema de Camões - DESCALÇA VAI PARA A FONTE, LEONOR...

 

Descalça vai para a fonte
Lianor pela verdura;
Vai fermosa, e não segura.

Leva na cabeça o pote,
O testo nas mãos de prata,
Cinta de fina escarlata,
Sainho de chamelote;
Traz a vasquinha de cote,
Mais branca que a neve pura.
Vai fermosa e não segura.

Descobre a touca a garganta,
Cabelos de ouro entrançado
Fita de cor de encarnado,
Tão linda que o mundo espanta.
Chove nela graça tanta,
Que dá graça à fermosura.
Vai fermosa e não segura.

                  Luís de Camões

Soneto de Camões - QUEM DIZ QUE AMOR É FALSO OU ENGANOSO

Quem diz que Amor é falso ou enganoso,
ligeiro, ingrato, vão, desconhecido,
sem falta lhe terá bem merecido
que lhe seja cruel ou rigoroso.

Amor é brando, é doce e é piedoso.
Quem o contrário diz não seja crido;
seja por cego e apaixonado tido,
e aos homens, e inda aos deuses, odioso.

Se males faz Amor, em mi se vêem;
em mim mostrando todo o seu rigor,
ao mundo quis mostrar quanto podia.

Mas todas suas iras são de Amor;
todos os seus males são um bem,
que eu por todo outro bem não trocaria.

Luís de Camões

Soneto de Camões - ONDE ACHAREIS LUGAR TÃO APARTADO


Onde acharei lugar tão apartado
E tão isento em tudo da ventura,
Que, não digo eu de humana criatura,
Mas nem de feras seja frequentado?

Algum bosque medonho e carregado,
Ou selva solitária, triste e escura,
Sem fonte clara ou plácida verdura,
Enfim, lugar conforme a meu cuidado?

Porque ali, nas entranhas dos penedos,
Em vida morto, sepultado em vida,
Me queixe copiosa e livremente;

Que, pois a minha pena é sem medida,
Ali triste serei em dias ledos
E dias tristes me farão contente.

                        Luís de Camões

 

Poema de Camões - A MORTE QUE DA VIDA O NÓ DESATA

 A Morte, que da vida o nó desata,

os nós, que dá o Amor, cortar quisera
na Ausência, que é contra ele espada fera,
e com o Tempo, que tudo desbarata.

Luís de Camões

Soneto de Camões - AMOR, COM A ESPERANÇA JÁ PERDIDA

Amor, com a esperança já perdida
o teu sagrado templo visitei;
por sinal do naufrágio que passei,
em lugar dos vestidos, pus a vida.

Que queres mais de mi, que destruída
me tens a glória toda que alcancei?
Não cures de forçar-me, que não sei
tornar a entrar onde não há saída.

Vês aqui a alma, a vida e a esperança,
despojos doces do meu bem passado,
emquanto quis aquela que eu adoro.

Neles podes tomar de mi vingança:
e, se ainda não estás de mi vingado,
contenta-te com as lágrimas que choro. 

 

Luís de Camões

Soneto de Camões - AMOR MIL VEZES JÁ ME TEM MOSTRADO

Amor mil vezes já me tem mostrado
o ser-me vida o mesmo fogo ardente,
como quem queima um dedo e facilmente
no mesmo fogo o torna a ver curado.

Meu mal, tristeza, dor, pena e cuidado,
o bem, a vida alegre, ser contente
naquela vista pura e excelente
pôs, por essa maneira, o tempo e fado.

Que veja mil mudanças num momento,
que cresça nelas todas sempre a dor
não sei, que os meus castelos são de vento!

O tempo, que vos mostra ser senhor,
por mais que contra mi se mostre isento,
há de tornar por tempo tudo amor
.

Luís de Camões

Soneto de Camões - TOMOU-ME VOSSA VISTA SOBERANA



Tomou-me vossa vista soberana
Aonde tinha as armas mais à mão,
Por mostrar que quem busca defensão
Contra esses belos olhos, que se engana.

Por ficar da vitória mais ufana,
Deixou-me armar primeiro da razão;
Cuidei de me salvar, mas foi em vão,
Que contra o Céu não vale defensa humana.

Mas porém, se vos tinha prometido
O vosso alto destino esta vitória,
Ser-vos tudo bem pouco está sabido.

Que posto que estivesse apercebido,
Não levais de vencer-me grande glória;
Maior a levo eu de ser vencido.

                          Luís de Camões

Poema de Camões - VERDES SÃO OS CAMPOS


Verdes são os campos,
De cor de limão:
Assim são os olhos
Do meu coração.

Campo, que te estendes
Com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,
De ervas vos mantendes
Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.

Gados que pasceis
Com contentamento,
Vosso mantimento
Não no entendereis;
Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.

Luís de Camões

Soneto de Camões - LEMBRANÇAS, QUE LEMBRAIS BEM MEU PASSADO

 

Lembranças, que lembrais meu bem passado,
Pera que sinta mais o mal presente,
Deixai-me, se quereis, viver contente,
Não me deixeis morrer em tal estado.

Mas se também de tudo está ordenado
Viver, como se vê, tão descontente,
Venha, se vier, o bem por acidente,
E dê a morte fim a meu cuidado.

Que muito melhor é perder a vida,
Perdendo-se as lembranças da memória,
Pois fazem tanto dano ao pensamento.

Assim que nada perde quem perdida
A esperança traz de sua glória,
Se esta vida há de ser sempre em tormento.

                   Luís Vaz de Camões

Poema de Camões - O TEMPO ACABA O ANO, O MÊS, A HORA

 

O tempo acaba o ano, o mês e a hora,
A força, a arte, a manha, a fortaleza;
O tempo acaba a fama e a riqueza,
O tempo o mesmo tempo de si chora;

O tempo busca e acaba o onde mora
Qualquer ingratidão, qualquer dureza;
Mas não pode acabar minha tristeza,
Enquanto não quiserdes vós, Senhora.

O tempo o claro dia torna escuro
E o mais ledo prazer em choro triste;
O tempo, a tempestade em grão bonança.

Mas de abrandar o tempo estou seguro
O peito de diamante, onde consiste
A pena e o prazer desta esperança.

                      Luís de Camões

Poema de Camões - PROMETEIS E NÃO CUMPRIS?

Prometeis, e não cumpris?

Pois sem cumprir, tudo é nada.
Não sois bem aconselhada;
que quem promete, se mente,
o que perde não o sente.

Luís de Camões

Soneto de Camões - AMOR É FOGO QUE ARDE SEM SE VER

 Amor é fogo que arde sem se ver;

É ferida que dói, e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que se ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Luís de Camões 

Soneto de Camões - QUE ME QUEREIS, PERPÉTUAS SAUDADES?

Que me quereis, perpétuas saudades?
Com que esperança inda me enganais?
Que o tempo que se vai não torna mais,
E se torna, não tornam as idades.

Razão é já, ó anos, que vos vades,
Porque estes tão ligeiros que passais,
Nem todos pera um gosto são iguais,
Nem sempre são conformes as vontades.

Aquilo a que já quis é tão mudado,
Que quase é outra cousa, porque os dias
Têm o primeiro gosto já danado.

Esperanças de novas alegrias
Não mas deixa a Fortuna e o Tempo errado,
Que do contentamento são espias.
Luís de Camões

Soneto de Camões - EU CANTAREI DE AMOR TÃO DOCEMENTE

 


Eu cantarei de amor tão docemente,
Por uns termos em si tão concertados,
Que dois mil acidentes namorados
Faça sentir ao peito que não sente

Farei que amor a todos avivente,
Pintando mil segredos delicados,
Brandas iras, suspiros magoados,
Temerosa ousadia e pena ausente.

Também, Senhora, do desprezo honesto
De vossa vista branda e rigorosa,
Contentar-me-ei dizendo a menor parte.

Porém, pera cantar de vosso gesto
A composição alta e milagrosa
Aqui falta saber, engenho e arte.

                    Luís de Camões

Soneto de Camões - ALMA MINHAGENTIL, QUE TE PARTISTE

Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou. 

 

Luís de Camões

Soneto de Camões - UM MOVER DE OLHOS, BRANDO E PIEDOSO

Um mover de olhos, brando e piedoso,
Sem ver de quê; um riso brando e honesto,
Quase forçado; um doce e humilde gesto,
De qualquer alegria duvidoso;

Um despejo quieto e vergonhoso;
Um repouso gravíssimo e modesto;
Uma pura bondade, manifesto
Indício da alma, limpo e gracioso;

Um encolhido ousar; uma brandura;
Um medo sem ter culpa; um ar sereno;
Um longo e obediente sofrimento:

Esta foi a celeste formosura
Da minha Circe, e o mágico veneno
Que pôde transformar meu pensamento.

 Luís de Camões

Poema de Camões - PORQUE, ENFIM, TUDO PASSA...

Porque, enfim, tudo passa;

Não sabe o Tempo ter firmeza em nada; E a nossa vida escassa Foge tão apressada. Que quando se começa é acabada.

Luís de Camões

Poema de Camões - QUADRA: VERDADEIRO VALOR NÃO DÃO

 

Verdadeiro valor não dão à gente;
Essas honras vãs, esse ouro puro
melhor é merecê-los sem os ter
que possuí-los sem os merecer.


Poema de Camões - TANTO DE MEU ESTADO ME ACHO INCERTO

Tanto de meu estado me acho incerto,
que em vivo ardor tremendo estou de frio;
sem causa, juntamente choro e rio,
o mundo todo abarco e nada aperto.

É tudo quanto sinto, um desconcerto;
da alma um fogo me sai, da vista um rio;
agora espero, agora desconfio,
agora desvario, agora acerto.

Estando em terra, chego ao Céu voando,
um'hora acho mil anos, e é de jeito
que em mil anos não posso achar um' hora.

Se me pergunta alguém porque assim ando,
respondo que não sei; porém suspeito
que só porque vos vi, minha Senhora.

Luís de Camões

Poema de Camões - ENDECHAS A BÁRBARA ESCRAVA

 

Endechas a Bárbara escrava

Aquela cativa
Que me tem cativo,
Porque nela vivo
Já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
Em suaves molhos,
Que pera meus olhos
Fosse mais fermosa.

Nem no campo flores,
Nem no céu estrelas
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.

U~a graça viva,
Que neles lhe mora,
Pera ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vão
Perde opinião
Que os louros são belos.

Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda mansidão,
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas bárbara não.

Presença serena
Que a tormenta amansa;
Nela, enfim, descansa
Toda a minha pena.
Esta é a cativa
Que me tem cativo;
E. pois nela vivo,
É força que viva.

Luís de Camões


Soneto de Camões - DITOSO SEJA AQUELE QUE SOMENTE


Ditoso seja aquele que somente
Se queixa de amorosas esquivanças;
Pois por elas não perde as esperanças
De poder n'algum tempo ser contente.

Ditoso seja quem estando ausente
Não sente mais que a pena das lembranças;
Porque, inda que se tema de mudanças,
Menos se teme a dor quando se sente.

Ditoso seja, enfim, qualquer estado,
Onde enganos, desprezos e isenção
Trazem o coração atormentado.

Mas triste quem se sente magoado
De erros em que não pode haver perdão,
Sem ficar na alma a mágoa do pecado.

           Luís de Camões Sonetos (1880)

quarta-feira, 26 de março de 2025

GUIA DE LEITURA EM POESIA


 

Por iniciativa do Plano Nacional de Leitura, é divulgado no Blogue da Escultor o guia de leitura em Poesia.

Neste guia, podemos encontrar respostas para as perguntas:

Ler poesia: porquê?

Ler poesia: o quê e como?

Ler poesia: que poemas, quando e como?

Podemos ainda encontrar poemas e atividades para o pré-escolar, o primeiro ciclo, o segundo e terceiro ciclos, bem como (caso seja do interesse da comunidade educativa extraescolar) poemas e atividades para o ensino secundário. Fica aqui a lista de poemas a explorar:

Para uma abordagem pedagógica dos poemas e demais informações relevantes, basta carregar no seguinte link: 

https://www.pnl2027.gov.pt/np4/guiadeleituradepoesia2025.html

segunda-feira, 24 de março de 2025

BOOKFLASH - Projeto de Leitura: Heróis da nossa História

Luís de Camões

Autor: A. do Carmo Reis

Coleção: História Júnior

Editora: Edições ASA


Resumo: A narrativa percorre a juventude de Luís de Camões, o envolvimento dele na corte portuguesa, algumas aventuras e dificuldades ao longo da vida como por exemplo o tempo que passou na África e na Ásia.


O livro refere também a obra prima de Camões: Os Lusíadas, que exalta as conquistas marítimas de Portugal e os desafios que os navegadores ultrapassam durante a sua viagem, bem como as grandes façanhas dos Portugueses, a fértil imaginação de camões no Plano Mitológico e o seu espírito crítico no Plano das Considerações do Poeta.


Comentário: É um livro interessante que não só com texto informativo de linguagem simples e sóbria, mas também com ilustrações cativantes, apresenta uma minibiografia de um grande poeta português.

 

Citação que me marcou: “Guardava consigo as lições da vida e não cedia facilmente ao desânimo”


Recomendação aos colegas: Recomendo o livro para quem gosta de aprender sobre figuras históricas.


Beatriz Teixeira Rodrigues nº3 9ºC


BOOKFLASH - Projeto de Leitura: Heróis da nossa História

 Vasco da Gama 

Autor: A. do Carmos Reis 

Coleção: História Júnior 

Editora. Edições ASA 

Resumo: 

Este livro conta-nos a biografia de um dos heróis portugueses citados na obra Os Lusíadas, Vasco da Gama, nascido em 1468 em Sines, cidade portuguesa na região do Alentejo. Ao longo da sua infância e mocidade, Vasco tomou consciência da importância das navegações marítimas e desenvolveu a vontade de querer fazer parte de uma grande expedição marítima, sonho esse que se veio a realizar mais tarde quando D. Manuel I decidiu dar continuidade ao programa de Expansão Marítima que estaria a ser desenvolvido por D. João II, o qual tinha o objetivo de fazer os portugueses chegar ao Oriente através dos mares. 

Assim, em 1497, foi entregue a Gama o comando de uma pequena armada e partiram para a Índia, viagem essa que só terminou em 1499 com o seu regresso a Portugal e que lhe concedeu a si e à família o título de Dom, nomeou-o Almirante do mar das Índias e fez dele Conde da Vidigueira. 

A 1524, na noite de Natal, precisamente na transição de 24 para 25 de dezembro, acabou por falecer em Cochim, bastante longe da sua casa e da sua família. 

Citação que me marcou: 

Vasco da Gama era testemunha de tanta glória. Mas nunca terá pensado, ao ouvir os monges a cantar no mosteiro, que havia de ter sepultura dentro da sua igreja.” 

Opinião: 

Este livro permitiu-me expandir os meus conhecimentos a nível da cultura e eu recomendo-o a pessoas que gostem de História e que queiram saber um bocadinho mais acerca dos Descobrimentos, do nosso país e da vida de Vasco da Gama.

Matilde Magalhães

BOOKFLASH - Projeto de Leitura: Heróis da nossa História

Bartolomeu Dias

Editora - Edições ASA

Coleção - História Junior 

Resumo - Bartolomeu Dias nasceu em 1460 numas terras perto do Algarve , foi o primeiro europeu a contornar o extremo sul  de África , o Cabo da Boa esperança como ficou conhecido , antes chamado Cabo das Tormentas devido ao Adamastor (uma figura imaginada e contida na História de Os Lusíadas).

Foi em 1488 que este feito de Bartolomeu Dias aconteceu , os portugueses queriam ir para a índia por mar mas este foi o grande desafio.

D.João ll encarregou esta tarefa a Bartolomeu Dias a encontrar a passagem para marítima para   oceano índico, com  uma armada de duas  caravelas e um bardo de mantimentos , saíram de Portugal  em agosto de 1487 e chegaram em 1488 no mês de fevereiro.

Esta rota deu permissão para Vasco da Gama ir para a índia  em 1497, mais tarde em 1500 Bartolomeu Dias foi com  Pedro Álvares Cabral descobrir a Terra de Vera Cruz (atualmente o Brasil) no dia 22 de abril.

No dia 2 de maio, morreu paradoxalmente num naufrágio a tentar voltar a Portugal nas proximidades do cabo que dobrara e que renomara.


COMENTÁRIO: Foi muito enriquecedor ler este livro, pois adquiri informações que não sabia e senti-me orgulhoso desta figura história que foi pioneiro numa façanha nunca antes alcançada!


CITAÇÂO: "Se nunca tentarmos, mesmo com a consciência do perigo, nunca conseguiremos ir mais além".


Bernardo Rodrigues


domingo, 23 de março de 2025

Por que é que as crianças têm medo do escuro?


           Por é que as crianças têm medo do escuro? Pelo que a escuridão pode ocultar. Acende-se a luz e tudo volta a ser familiar. É preciso acender luzes que impeçam medos escusados. 

     Fim de tarde solarengo nas margens do Douro. Um homem alto

e magro de túnica azul acetinada levanta-se e ajoelha-se num

tapete multicolor sobre o empedernido da rua. Os transeuntes

olham-no de soslaio. Murmuram que não é na rua que se reza,

que agora gente dessa laia está por todo o lado, que saudades

do Salazar, que saudades das Cruzadas. Pensamentos bélicos

perante um homem que reza.

   Portugal é conhecido pela arte de acolher e há quem queira aprender a arte de cavalgar toda a sela para empunhar a espada. Sobretudo gente sem energia para ler um livro.

     O ódio transmite-se sem requisitos, do sussurro aos gritos com perdigotos, o ódio escurece as palavras, dá-lhes maus fígados, ao contrário da empatia que as engrandece e lhes franqueia horizontes. O horizonte de uma vida melhor! Esse é o objetivo primordial. Ah...mas há gentalha que vem para cá arranjar problemas.

Onde é que só existem pessoas de bem? Em que nacionalidade, credo ou cor da pele? Que língua falam? Como se vestem as pessoas inteiramente do Bem e da Verdade?

    Pergunto eu que tantas vezes pequei por pensamentos, palavras, atos e omissões. Há que aceitar tudo de todas as maneiras? Não! A ética está acima das tradições e dos rituais. Se atenta contra a ética, se é crime, não pode ser permitido sob nenhuma escusa de relativismo cultural.

    Partamos do princípio da empatia. Chegar a um país onde tudo é diferente e ser recebido com duas pedras na mão e já algumas a voar contra nós. Quem nunca pecou... É claro que é inadmissível que o profeta Mohammed tenha desposado uma menina com nove anos. Inaceitável! Inaceitável mesmo! Lembremo-nos, não obstante, que a Virgem Maria foi mãe de Jesus com 13 anos. É sempre uma questão de olhar para o próprio umbigo.  Há que pôr mais lentes no caleidoscópio. E há tanto de deslumbrante, de enriquecedor em aprender diferentes formas de ver o mundo: línguas diferentes, canções, trajes, danças, arte, gastronomia, saberes e sabores,... 

    Partamos do princípio do acolhimento, da inclusão, da integração, da empatia pelos quais somos reconhecidos em todo o mundo. 

     «“Caritas bonitas” são as das crianças» - dizia a avó Alzira ao fingir ler, no seu  analfabetismo, a inscrição memorizada na frontada de uma igreja. Desconhecia, como muitos, que Caritas(et)Bonitas significa Caridade e Bondade. E esses, sim, são os alicerces essenciais da portugalidade.

9ºC

Finalíssima do Torneio de Oratória em Português - Brilhante Desempenho do nosso João Carlos Macedo: A Multiculturalidade


 

CONCURSO DE ESCRITA CRIATIVA

 


      Vê o vídeo e lê, com a devida atenção, o texto sobre multiculturalidade.

       Escreve uma narrativa na qual narres um enredo que envolva uma situação, passada em Portugal, na atualidade, com pessoas de outras culturas. Escolhe a sua proveniência e faz uma pesquisa sobre as tradições desse país, a língua, a gastronomia, os trajes, os credos e as festividades.

     Elabora um enredo no qual os Portugueses mostrem a sua hospitalidade...ou não.

          Deixamos ao teu critério. Solicitamos apenas que dês nomes às personagens, que as descrevas e que o teu texto tenha diálogo ou, no mínimo, uma tentativa de comunicação (pois nem toda a comunicação é verbal).

          Os três melhores texto serão premiados! Envia os teus trabalhos para silviapinto@escultorfsa.pt até 15 de abril.

          

sexta-feira, 21 de março de 2025

DIA MUNDIAL DA POESIA - NÃO É AINDA A INQUIETA

 Não, não é ainda a inquieta

luz de março
à proa de um sorriso,
nem a gloriosa ascensão do trigo, a seda de uma andorinha roçando
o ombro nu,
o pequeno e solitário rio adormecido
na garganta;não, nem o cheiro acidulado e bom
do corpo depois do amor,
pelas ruas a caminho do mar,
ou o despenhado silêncio

da pequena praça,
como um barco, o sorriso à proa;

não, é só um olhar.

Eugénio de Andrade, in Branco no Branco

DIA MUNDIAL DA POESIA - AS AMORAS

 O meu país sabe às amoras bravas

no verão.


Ninguém ignora que não é grande,
nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.

Eugénio de Andrade

DIA MUNDIAL DA POESIA - PAISAGEM

 A névoa que desde manhã fechava

as portas todas ao rio foi-se embora.

A luz é fria: esta é agora

a minha terra, o outono.

Todas as terras são afinal as mesmas

folhas cobrindo a relva, às vezes

cintilando, quando o sol rasga a névoa.


Eugénio de Andrade