quarta-feira, 21 de maio de 2025

FUNÇÃO E SIGNIFICADO DO EPISÓDIO DA "ILHA DOS AMORES "N'OS LUSIADAS"


       

Resumo de um excerto retirado da obra Camões, Labirintos e Fascínios,  de Vítor Manuel de Aguiar e Silva.

       Os heróis Portugueses alcançam na Ilha dos Amores o clímax da sua ascensão divinatória.

        A ideia de que os heróis históricos, cantados por Camões, heróis reais de carne e osso ("de fraca carne humana") (IX, 91), ascendem, pelos seus feitos, à condição divina, constitui uma linha orientadora da epopeia camoniana.

       Esta divinização representa o coroamento de uma longa e penosa jornada de sacrifícios, constituindo o justo prémio concedido àqueles que viveram o ideal português da virtude humana: dedicar a vida à expansão da Pátria e à difusão da Fé.

    O episódio da Ilha dos Amores oferece uma importante simbologia ao representar o ponto alto da gesta descobridora de Portugal: os nautas podiam proclamar que, do mundo conhecido, estava a sua parte feita, o por-conhecer era só com Deus. E por isso a ninfa Tétis declara que a finalidade da sua presença naquela ilha consistia em revelar aos Portugueses os segredos do mundo ainda ignoto: "Dando-lhe a entender que ali viera/ Por alta influição do imóbil Fado,/ Pera lhe descobrir da unida Esfera/ Da terra imensa e mar não navegado/ Os segredos, por alta profecia/ O que esta sua Nação só merecia." (IX, 86).

    A ascensão divinizadora de Vasco da Gama e dos seus companheiros está cabalmente comprovada no especial favor que Deus, fonte de todo o saber, lhes concede: guiados por Tétis, subirão a um monte espesso, de cujo cimo poderão contemplar a máquina do mundo (descrita de acordo com a conceção ptolomaica).  

           O povo português ascende ao estatuto de povo eleito com missão ecuménica de difundir a fé cristã, estatuto esse reforçado pela crença no supremo destino de Portugal, com o qual Camões sonha, embora reconheça máculas na alma da nação: "Não mais, Musa, não mais, que a lira tenho/ Destemperada e a voz enrouquecida,/ E não do canto, mas de ver que venho/ Cantar a gente surda e endurecida./ O favor com que mais se acende o engenho,/ Não no dá a Pátria, não, que está metida/ No gosto da cobiça e da rudeza/ De uma austera, apagada e vil tristeza".