domingo, 5 de maio de 2024

Dia da Mãe sem Papas na Língua

 


    Nem todas as mães são mães. Há quem seja chamado de "Mãe" e seja uma mera progenitora. Uma genitora, pois aqui não há "prós", só contras... Quem não ama o(s) filhos(s) não é mãe. Parir? Parir é a coisa mais comum que existe e há espécies que devoram as próprias crias. Na vasta amplitude de significado do termo "devorar", alguns seres (des)humanos enquadram-se nesse cenário hediondo também.
    Às Mães, (sim, com "M" grande) dedico este texto. Uma Mãe não é a melhor amiga. Se uma mãe é a melhor amiga não está a ser Mãe. Demitiu-se. 
    Uma Mãe não agride. A vida encarregar-se-á das dores incontornáveis. Uma Mãe tem de ser a barreira contra as agressões, não a perpetradora. Agredir quem não se pode - ou, podendo, não se irá defender - chama-se covardia. Chama-se crueldade. Mesmo que embarquemos todos na farsa  do "Doeu-me mais a mim do que a ti". 
    O Dia da Mãe é uma falácia. É o Dia das palavras bonitas. O Dia dos cartões digitais, cartões-papinha-feita, pois os cartões desenhados e pintados à mão, com recortes e colagens, que estimulavam a criatividade e eram únicos, exigindo tempo e esforço, esses já só para os ignorantes digitais...e ninguém quer isso. Só países retardados como a Suécia é que estão a mudar o rumo da digitalização plena por ter constatado que não era o melhor caminho. Enfim, suecos... Não nos dispersemos.
     O Dia da Mãe é o dia do paleio. Ótimo para floristas, fábricas de bombons e lojas dos chineses, não obstante. À semelhança do Dia dos Namorados. A menos que o esforço seja mesmo nulo e aí nem as floristas, nem as fábricas de bombons, nem as lojas dos chineses - e acrescento - nem os restaurantes ficam a ganhar.  Cada um sabe de si e Deus, pelo estado em que o Mundo está, não sabe de ninguém. Se eu fosse Deus (não acho que sou, calma, ainda só penso que sou o Napoleão) também virava costas a uma humanidade tão mesquinha, tão espumante de raiva, tão sedenta de sangue, tão vingativa, tão vil (com honrosas exceções). 
     Escrevo este texto assolada por uma indignação indizível face ao crescendo de crimes de ódio. Há quem veja os imigrantes como uns grandes filhos da mãe (ou outro termo, que não posso nem quero escrever aqui). Há gente boa e má de todas as proveniências. Espero que este seja um texto datado no tempo. Há entregadores da Glovo hospitalizados que também têm (ou assim o espero) mãe. Se não têm já tiveram. Não vivem sob a sua asa. Fizeram-se à vida vindo para um país alegadamente seguro. Não ouvem a mãe dizer "Olha o casaquinho", ouvem trogloditas a tentar rebentar com portas. E com eles. Lá estou eu a dispersar-me. E com tanta verborreia floreada que há a dizer sobre as mães. Se tem algum jeito!
      Amanhã já não será Dia da Mãe. E nós, mães, vamos continuar como estamos hoje. A lidar com a indiferença da sobrecarga de trabalhos. Fomos mães porque quisemos, agora há que aguentar. Põe-se o rótulo da "mãe guerreira" e está a andar. Homenzinhos que nem à tropa querem ir apostrofam-nos de guerreiras. E somos. Não nos resta alternativa. Há que trabalhar, cuidar, prover, proteger, arrumar, cumprir burocracias, ser escravo do relógio e, idealmente manter a boca bem caladinha. Com a sorte nublada como o dia de hoje, ainda surgem no caminho uns quantos empecilhos escusados para dificultar mais uma jornada por si mesma árdua. E não são palhas nas costas, já curvadas, da camela. São calhaus tão pesados que nem sustentam o próprio peso. Se tivessem uma, a consciência também pesaria. Se tivessem...
      Verdade seja dita que há lares, playstations, apps e coisas que tais que podem resolver os problemas, Se a Mãe (neste dia tão enlevada) se torna um fardo, há lares para quê? Se os filhos exigem cuidado, amor, entrega e atenção há o universo digital para quê? As horinhas passam a voar! A rua e as noitadas com os amigos (onde muda tudo menos o telemóvel, que continua na mão), assim como as viagens (pasmo-me sempre como há gente tão nova a ganhar tanto dinheiro para financiar tanta viagem em idades tão precoces da sua vida! Pasmo-me, mas congratulo-me: nada como arregaçar as mangas desde cedo! Eu fi-lo, isso do arregaçar as mangas bem cedo na vida, mas nunca via o envelope). E lá estou eu a dispersar. A rua, as noitadas e as viagens também são substitutos do cuidado, da supervisão e da autoridade maternais. As mães têm de compreender que os filhos a quem dão a sopinha, lavam, estendem, apanham e engomam a roupinha, querem ter as regalias dos adultos, mas sem as responsabilidades da idade adulta; Síndroma do Peter Pan: é o que não falta por aí...
        Meus queridos alunos: se têm Mães, essas com "M", o vosso lugar é na escola. E em casa, onde são amados. As crianças, os adolescentes...retribuem o que lhes é dado. Recebem imbecilidade? Serão imbecis ao quadrado. Recebem amor? Serão exponencialmente amorosos até ao Infinito.
       Uma Mãe partilha com os seus filhos as altas expectativas que tem para eles, a consciência de que são capazes,... e substitui o chinelo no ar por um "Eu ajudo!" Uma genitora que tem uma ato de agressividade falhou. Such a looser, como diriam os alunos com altíssima proficiência a Inglês. Uma genitora que pergunta: "Não te sabes defender?" está no lado errado da barricada. Não tem inteligência para perceber que a culpa de uma agressão é do agressor. La Palisse concordaria.
    E uma Mãe é alguém maravilhoso, fantástico, multifacetado, blábláblá... Pronto, para o contentamento de todos! Afinal, há que promover o bem-estar e a felicidade em contexto escolar, certo?
      Feliz Dia da Mãe!
     
A Coordenadora de Bibliotecas Escolares do Agrupamento Escultor António Fernandes de Sá,
Sílvia Pinto